Busca por notícia gera alívio e dor
01-02-2013 10:51Uma manhã amarga
Eram por volta das nove horas da manhã de um domingo, que até então se encaminhava para um dia normal, como os outros. Naquele momento, a porta do quarto onde eu estava se abriu em uma velocidade imensa, que chegou a bater na parede. Ainda meio cambaleante por ter sido acordado, apenas escutava uma voz, “Acorda, acorda e ligue a TV... Aconteceu um acidente em Santa Maria”, a voz que ecoava nos meus ouvidos, que repetia a frase rapidamente, se originava da avó de um amigo meu.
Ainda sem entender a grande confusão sobre o tal acidente, meio que retornei ao meu sono, mas a voz completava a informação “Foi numa boate em Santa Maria, na Kiss, mais de 200 pessoas estão mortas”. Foi quando dei um salto da cama e comecei a interligar as informações dadas, que ao pensar em boate, mais cidade universitária, e o dado relevante ‘mais de 200 pessoas’, foi o bastante para acordar e a sensação de preocupação invadir meus pensamentos.
Neste exato momento peguei meu celular, que estava ao lado em cima de uma mesa, e comecei a ligar para os amigos que residiam em Santa Maria, ainda sem pensar nos amigos e familiares que podiam ou não estar passando as férias naquela cidade. O pavor teve início quando celulares não eram atendidos ou estavam sem sinal.
Felizmente alguns amigos começaram a dar sinal de vida, seja por telefone ou por redes sociais. Transformando momenta-neamente a angústia em alívio, no entanto foi por pouco tempo que o sentimento de conforto reinou. Me lembrei de um amigo de São Borja, Maicon Francisco Evaldt, funcionário do Banco do Brasil, que na tarde de quinta-feira tinha conversado com ele em uma rede social sobre a sua ida a Santa Maria.
O assunto principal da breve conversa era sobre festas, pois como estaria em São Borja, poderíamos nos reunir em algum bar, como ele mesmo disse: “bah eu tava a fim de umas festinhas em São Borja, mas amanhã tenho que partir para Santa Maria, terá uma formatura... vai ter que ficar para a próxima neh”.
Infelizmente, não terá próxima pelo menos neste mundo, pois Francisco estava entre as vítimas fatais do acidente na boate Kiss. Então a angústia agora com uma mistura de sofrimento e tristeza imperava minha cabeça, a informação sobre sua morte tinha chegado por um telefonema de uma amiga, que ao escutar foi como se tivesse levado um soco forte no peito.
Realmente era uma sensação de não querer acreditar e de querer buscar mais informações sobre, foi então que acompanhei toda a programação da RBS TV, que fez um plantão especial sobre o acontecimento, apenas me restava rezar para que não tivesse mais amigos envolvidos na tragédia.
Então recebi uma ligação do meu irmão, e antes de atender já pressentia que viria alguma notícia ruim, mas ainda não conseguia pensar em alguém da família que poderia estar no acidente. Foi então que meu irmão, também com voz sonolenta, dizia que meu primo Robson Van Der Ham realizou o seu show com a banda Pimenta & Seus Comparsas naquele local, e que estava desaparecido. Eis, outro soco no meu coração, agora ainda mais forte, mas diferente de Francisco, ainda restava alguma esperança.
Até às duas da tarde ainda não tinha novidades sobre meu primo, até tinha medo de receber outra ligação, seja ela do meu irmão ou de qualquer outro parente, pois não saberia se seria notícia boa ou ruim. Sentia uma dor imensa e ao mesmo tempo de impotência de não estar em Santa Maria ao lado dos meus tios, que ainda buscavam informações sobre seu filho.
Foi quando escutei o toque do meu celular. Deixei tocar alguns segundos por medo de atender. E atendi. Era a minha mãe dizendo que tinham achado o corpo do meu primo, então neste mesmo tempo em que escutava a voz da minha mãe, uma espécie de filme passava pela minha cabeça, pois fazia tempo que não o via, mas tive a oportunidade de ir a um show dele ano passado, em São Borja, com a banda Excellence e ter a chance de abraçá-lo, só não sabia que seria o último abraço.
Era para ser mais um show na sua carreira brilhante. Era para ser mais um “cachê” no sustento de sua esposa Sidineia Van Der Ham e de sua filhinha Isabele, mas a madrugada de domingo lhe reservara algo diferente.
Incentivado desde pequeno a música, pelos seus pais Cláudio e Lenir Van Der Ham, e pelo seu irmão Douglas, Robson Van Der Ham, 31 anos, natural de Ijuí-RS, infelizmente acabou sendo uma das 235 vítimas da boate Kiss. Sempre alegre e amigo das pessoas, Robson trilhava o mundo musical juntamente com o seu baixo, entre as bandas Excellence e Pimenta & Seus Comparsas.
Então, aqui está a minha singela homenagem ao meu amigo Maicon Francisco Evaldt e para meu primo Robson Van Der Ham, que deixará um vazio enorme, mas ao mesmo tempo um grande exemplo de filho, de pai, de amigo e de primo. Sentirei saudades.
À minha guriazinha amada!!!
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Tragédia em SM mata aproximadamente 235 pessoas....Não...muito mais..centenas de pessoas também morreram com esses jovens e cada família, cada amigo tem uma história especial com eles para contar. A minha história especial é com a Francielli Araújo Vieira, uma doce menina da cidade de Itaqui. Nossos caminhos se cruzaram em Uruguaiana durante a graduação da Fran em Farmácia. Já nas primeiras aulas fui dominada pelos encantamentos dela e desde então nunca mais escapei. Viemos juntas pra Santa Maria, onde ela começou juntamente comigo seus trabalhos de pesquisa e ingressou no mestrado sob minha orientação. Depois de 3 anos em SM consegui montar meu laboratório de pesquisa, onde tenho aproximadamente 15 alunos da pós graduação....mas a Fran sempre esteve comigo...mesmo quando eu não tinha laboratório, não tinha bolsa de auxílio a pesquisa para oferecer a ela....meu braço direito!!! Meu laboratório passou a ser, além de um local de muito trabalho, um local de muita alegria, porque nele trabalhava a Francielli. Ela contagiava a todos com sua alegria, simpatia, humildade. Ninguém escapava dos encantos da Fran....Quando chegava alguém novo no laboratório ela já ia indo se apresentando, beijando, abraçando e indagando..e em questões de horas já se tornava íntima da pessoa. Não deixava ninguém ficar quieto ou triste por muito tempo...já começava a brincar e fazer de tudo para a pessoa se soltar e sorrir....com ela não existia mau tempo...estava sempre de bem com a vida!!! E além da alegria e do sorriso eternos, era extremamente estudiosa, competente e inteligente. Ela conseguia conciliar tudo isso...e fazia do trabalho uma forma divertida de aproveitar a vida. Isso pra mim é raro, porque a maioria das pessoas separa trabalho de relaxamento, de diversão...ela estava satisfeita profissionalmente..isso me consola muito!!
De certa forma, todos percebiam e sabiam que ela era uma pessoa diferenciada...no nosso departamento ela era Popular...ela não passava desapercebida.
É estranho...eu sempre tive medo de perdê-la e as vezes eu pensava "não consigo me imaginar sem esta guriazinha"....tinha medo que ela decidisse fazer outra coisa que não perto de mim na Bioquímica!!! Agora, me sinto muito perdida...mas preciso acreditar em algo para seguir em frente. Não tenho uma religião definida, mas estou procurando acreditar que a Francielli foi um anjo de luz, um espírito bastante evoluído que passou pela terra e que juntamente com os outros jovens que morreram nesta tragédia, veio na missão de mostrar a humanidade que o homem precisa evoluir espiritualmente, desligando-se dos bens materiais, do egoísmo, da negligência, da ganância e deixando aflorar os sentimentos de solidariedade, desinteresse material, fé, Amor ao próximo e União. A morte desses jovens só terá algum sentido, se o homem conseguir analisar esses fatos e mudar seu comportamento em busca de melhorias em todos os aspectos. Assim pensemos que a Fran, como um espírito bem mais puro, iluminado e evoluído com relação aqueles que ficaram, não precisou ficar mais aqui para vivenciar todos os sofrimentos que a vida terrena traz...e que a morte não é o fim. Talvez seja muito difícil colocar isso em prática porque somos muito apegados a matéria e não conseguimos encarar a morte como um processo natural e talvez até como uma passagem para uma forma de vida melhor....mas devemos tentar!!!. Pensando assim, me sinto mais confortada e cultivo a esperança que um dia iremos nos reencontrar. Rezo para que a mãe, o pai, o irmão e a vozinha da Fran, bem como todos seus conhecidos, tenham muita força e busquem em alguma religião ou crença uma forma de amenizar toda essa dor e de compreender todo esse processo!! Escrevo a todos, principalmente a população de Itaqui, algumas atitudes que a conterrânea de vocês sempre tinha e que a tornava tão especial e que com certeza pode nos ajudar a nos tornarmos pessoas melhores também: sorria sempre (ela sorria quase que 24 horas), beije, abrace e elogie sempre seus amigos (ela fazia isso todos os dias com todos); deixe sempre a alegria e felicidade dominar a tristeza; seja humilde, solidário e amável com as pessoas; procure trabalhar naquilo que realmente o satisfaz (ela amava o que fazia); seja responsável, trabalhador e estudioso para conseguir alcançar seus objetivos.
Assim era a Fran ....fique com Deus Meu Amor e como um Anjo de luz ilumine sua família, seus amigos e o nosso Lab 3239, para que possamos continuar mesmo com a tua ausência!!!
Da tua Profe Nilda Barbosa
Santa Maria, a cidade universitária, nunca mais será a mesma
Escrevo estas mal traçadas linhas, sinto-me imensamente triste sem clima para voltar com toda aquela euforia, com muita animação, cheio de informações, de contar as coisas que você gostaria de ler, as fofocas mais famosas da cidade, Eu, estou triste, o Rio Grande do Sul, está triste, o Brasil está triste, o Mundo está triste, de perder jovens cheios de vida, de um futuro que só dariam alegrias a seus familiares, triste, de assistir gente, encurraladas, é como nadar no meio de tubarões, triste de somente haver uma porta de saída, triste de não haver uma porta que fosse de emergência, triste, de seguranças não possuírem uma comunicação de rádio (hand-tolk), dos extintores de incêndio que não funcionaram, de colocarem uma juventude de estudantes alegres e felizes por estarem cursando uma faculdade, comemorando como fazem os jovens, que até então não sabiam que estavam indo para um verdadeiro ALÇAPÃO. A ambição falou mais alto do que a preservação da vida humana, de gente despreparada para um evento de tamanha magnitude, triste de ver as imagens que chocaram o MUNDO e que jamais serão esquecidas, sei que é difícil tentar amenizar o sentimento de inúmeras famílias, curvei-me ao saber da notícia, rezei, muito como forma de solidariedade, o que não se consegue entender como foi acontecer tamanha tragédia, assim escrevo esse texto como forma de abraçar a essas famílias que perderam seus entes queridos, numa badala fatítica, e restando somente pedir a DEUS, que conforte e de alento a essas famílias. A misericórdia do Senhor é infinita.
Por José Antôni Lima
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